quinta-feira, 16 de maio de 2013

Contrato de empresas de ônibus do Rio é obra de ficção

                      DOMINGOS PEIXOTO / O GLOBO
Regras de concessão do serviço estabelecem conforto, eficiência e segurança como parâmetros
Luiz Ernesto Magalhães (Email · Facebook · Twitter)
Ruben Berta (Email · Facebook · Twitter)
Sem banheiro, funcionários de uma empresa de ônibus trabalham na Central do Brasil: prefeitura diz que há estabelecimentos conveniados 
Era uma vez um contrato de concessão do serviço de transporte rodoviário na cidade do Rio de Janeiro. Reproduzido em 2010 para quatro consórcios de empresas de ônibus, que ganharam o direito de operar as linhas da capital por pelo menos 20 anos, o texto bem que poderia se enquadrar numa obra de ficção. Um dos capítulos — ou cláusula, como é chamado — afirma categoricamente: a concessionária terá que garantir aos usuários “regularidade, continuidade, eficiência, segurança, conforto e cortesia”, entre outras obrigações. Aqueles que não cumprissem com as regras estariam sujeitos a punições. Brandas, como uma advertência. Ou severas, como uma declaração de inidoneidade. A Secretaria municipal de Transportes informou que aplicou até hoje 11 multas contratuais, já transitadas e julgadas na prefeitura, que somam cerca de R$ 1 milhão. Outras cinco estão em fase de recurso, no valor de R$ 251 mil.
Relatórios resumidos
A quinta reportagem da série “Máquinas mortíferas” mostra que, ao menos no papel, o sistema de ônibus no Rio deveria funcionar. A lista de regras que as empresas precisariam cumprir é cheia de itens genéricos, que beiram a perfeição. Em outra cláusula do contrato — conseguido através de requerimento de informação do vereador Cesar Maia (DEM) —, está previsto que a empresa deve “garantir a segurança do transporte, bem como a integridade física e o conforto dos usuários”. Um dos artigos diz que ela deve “tratar o público com urbanidade e educação”.
Além dos trechos genéricos, há outros pontos específicos que poderiam ser bastante úteis, mas, na prática, parecem longe do ideal. O contrato determina, por exemplo, que os consórcios deveriam relatar mensalmente à prefeitura não só as reclamações que recebem de passageiros, como todas as providências tomadas em relação às queixas. Embora a Federação das Empresas de Transportes (Fetranspor) tenha informações detalhadas, a Secretaria municipal de Transportes só recebe um relatório resumido, que não indica as medidas tomadas em relação às denúncias. Em fevereiro e março deste ano, por exemplo, usuários relataram até nove agressões físicas. A secretaria alegou que dispõe ainda de central própria e do serviço 1746 para auxiliar nos seus trabalhos de fiscalização.
Um exemplo de informação que ficou pelo caminho pode ser visto no relatório da Fetranspor de abril. Ali, é possível perceber que 295 reclamações estavam sem resposta desde janeiro. Do total, 75% referem-se a apenas duas empresas: Redentor (53%) e Futuro (22%). Segundo a entidade, o problema foi provocado pela substituição do funcionário responsável por atender às queixas. O novo responsável pelo setor passou por reciclagem e ontem já não haveria reclamações em aberto.
Sem banheiros
Outro ponto curioso do contrato é o que previa que, em um ano, todos os pontos finais de ônibus teriam que ter instalações sanitárias para o uso de funcionários. Em locais de muita movimentação, como a Central do Brasil, porém, não se avistam banheiros. Ontem à tarde, um funcionário inclusive urinava encostado num coletivo. Tanto a Fetranspor quanto a Secretaria de Transportes alegam que, quando não há sanitários instalados nos pontos ou terminais, os funcionários vão a estabelecimentos comerciais conveniados.
Apesar de toda a polêmica recente em torno da identificação de motoristas infratores, o contrato original já previa que o consórcio deveria “permitir livre acesso de fiscalização”. A Secretaria de Transportes informou que não há registro de caso de acesso negado. Mesmo assim, publicou resolução no mês passado “para obrigar que todos os reais infratores sejam identificados, determinando que a não informação passa a ser falta contratual”.

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